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Animais Endémicos de Portugal: Espécies que Só Encontramos Cá

Maio 6, 2025
Lagartixa-da-Madeira - espécie endémica da Madeira

A biodiversidade de um território é frequentemente avaliada não apenas pela quantidade de espécies que nele habitam, mas também pela singularidade dessas mesmas espécies. Neste contexto, as espécies endémicas representam verdadeiros tesouros naturais: são organismos que evoluíram exclusivamente numa determinada região geográfica e que não ocorrem naturalmente em nenhum outro local do planeta. Esta exclusividade torna-as particularmente valiosas e, simultaneamente, vulneráveis.

Portugal, apesar da sua dimensão territorial relativamente modesta, destaca-se pela riqueza da sua biodiversidade endémica. O território português, pela sua localização geográfica privilegiada, história geológica e diversidade de habitats, proporcionou condições singulares para a evolução de espécies únicas no continente e, de forma ainda mais expressiva, nos arquipélagos dos Açores e da Madeira. Estas ilhas, devido ao seu isolamento, funcionaram como autênticos laboratórios evolutivos, originando espécies que não existem em nenhum outro ponto do globo.

Conhecer estas espécies não é apenas um exercício de curiosidade científica, mas representa também uma responsabilidade de conservação, pois a extinção de uma espécie endémica significa a sua desaparição definitiva do planeta.

Veja também:

Animais Endémicos de Portugal Continental

O território continental português, integrado na Península Ibérica, partilha muitas das suas espécies com Espanha. No entanto, existem alguns animais que são exclusivos de Portugal ou de regiões específicas dentro das nossas fronteiras.

Sapo-parteiro-ibérico (Alytes cisternasii)

O sapo-parteiro-ibérico é um pequeno anfíbio endémico da Península Ibérica, com uma distribuição principalmente concentrada no centro e sul de Portugal e em regiões adjacentes de Espanha. Embora não seja exclusivamente português, a sua distribuição é maioritariamente no nosso território, tornando-o uma espécie de particular relevância para a conservação nacional.

Este anfíbio distingue-se pelo seu comportamento reprodutivo extraordinário: é o macho que transporta os ovos fertilizados enrolados nas suas patas traseiras, protegendo-os até à eclosão. Esta peculiaridade valeu-lhe o nome de “parteiro”. Com uma coloração acastanhada e dimensões reduzidas (raramente ultrapassando os 5 centímetros), o sapo-parteiro-ibérico habita principalmente zonas de bosque mediterrânico, áreas rochosas e cursos de água temporários.

As principais ameaças à sua conservação incluem a destruição e fragmentação dos habitats, a poluição dos meios aquáticos e, mais recentemente, a propagação do fungo quitrídio, responsável pelo declínio de populações de anfíbios em todo o mundo.

Lagartixa-de-Bocage (Podarcis bocagei)

A lagartixa-do-ocidente, também conhecida como lagartixa de Bocage, é um réptil endémico do noroeste da Península Ibérica, com a sua distribuição centrada principalmente no norte de Portugal.

Esta espécie adaptou-se a uma grande variedade de habitats, desde zonas costeiras a áreas montanhosas, podendo ser encontrada em muros de pedra, afloramentos rochosos, troncos de árvores e até em zonas urbanas. A sua capacidade de adaptação a ambientes modificados pelo homem tem permitido que mantenha populações relativamente estáveis, embora a intensificação agrícola e a destruição de habitats naturais representem ameaças crescentes.

O nome desta espécie homenageia José Vicente Barbosa du Bocage, zoólogo português do século XIX que deu contributos significativos para o conhecimento da fauna de Portugal e das antigas colónias.

Saramugo (Anaecypris hispanica)

Créditos da foto: Carlos Carrapato – Fonte ICNF

O saramugo é um pequeno peixe de água doce endémico das bacias hidrográficas do sudoeste ibérico, principalmente do rio Guadiana, em Portugal. Com o seu corpo alongado e prateado, raramente ultrapassa os 7 centímetros de comprimento, sendo uma das espécies de peixe mais pequenas da nossa fauna continental.

Este peixe habita preferencialmente pequenos cursos de água com corrente moderada, fundos de cascalho ou areia e vegetação aquática abundante. Infelizmente, o saramugo é também uma das espécies mais ameaçadas da ictiofauna portuguesa, classificado como “Criticamente em Perigo” devido ao declínio acentuado das suas populações nas últimas décadas.

As principais ameaças à sua sobrevivência incluem a construção de barragens e açudes (que fragmentam o seu habitat), a poluição aquática, a extração excessiva de água para irrigação e a introdução de espécies exóticas predadoras ou competidoras. Vários projetos de conservação têm sido implementados para proteger este peixe emblemático dos nossos rios, incluindo programas de reprodução em cativeiro e reintrodução em habitats adequados.

Animais Endémicos do Arquipélago dos Açores

Os Açores, com o seu isolamento oceânico e origem vulcânica recente, apresentam níveis de endemismo particularmente elevados, especialmente no que diz respeito aos invertebrados e a algumas aves. Estas ilhas constituem um exemplo notável de processos evolutivos em sistemas insulares.

Morcego-dos-Açores (Nyctalus azoreum)

O morcego-dos-Açores tem a distinção de ser o único mamífero terrestre endémico do arquipélago, representando um caso fascinante de evolução insular. Ligeiramente menor que o seu parente continental, o morcego-arborícola (Nyctalus leisleri), esta espécie evoluiu em isolamento nas ilhas açorianas, desenvolvendo características adaptativas únicas, incluindo hábitos mais diurnos do que é habitual em morcegos — um comportamento possivelmente relacionado com a ausência de predadores naturais nas ilhas.

Este quiróptero pode ser observado a caçar insetos mesmo durante o dia, especialmente em dias nublados ou junto a lagos e zonas húmidas. Distribui-se por várias ilhas do arquipélago, incluindo São Miguel, Terceira e Pico, habitando tanto florestas naturais como áreas modificadas pelo homem, incluindo parques urbanos.

Classificado como “vulnerável” pela IUCN (União Internacional para a Conservação da Natureza), o morcego-dos-Açores enfrenta ameaças como a perda de habitat florestal, a perturbação dos seus abrigos e o uso de pesticidas que reduzem as populações de insetos que constituem a sua alimentação.

Pombo-das-Rochas-dos-Açores (Columba palumbus azorica)

Créditos da foto: Rita Melo in Azores.gov.pt

O pombo-das-rochas-dos-Açores é uma subespécie endémica do pombo-torcaz, que evoluiu isoladamente no arquipélago. Distingue-se da subespécie continental pelas suas dimensões ligeiramente menores e por algumas diferenças na plumagem, adaptações que ocorreram ao longo de milhares de anos de isolamento genético nas ilhas.

Esta ave habita principalmente as florestas laurissilva do arquipélago, um tipo de floresta primitiva que em tempos cobria grande parte das ilhas. A destruição deste habitat para dar lugar a pastagens e áreas agrícolas representou uma ameaça significativa para a espécie, que viu a sua área de distribuição reduzir-se drasticamente.

Atualmente, beneficia de medidas de proteção do seu habitat e de programas de reflorestação com espécies nativas, que têm permitido uma recuperação gradual das suas populações em algumas ilhas do arquipélago.

Invertebrados Endémicos das Florestas de Laurissilva

Floresta Laurissilva da Madeira – Créditos da foto: Hugo Rei in visitmadeira.com

As florestas de laurissilva dos Açores, relíquias de florestas subtropicais que em tempos cobriam extensas áreas da Europa, albergam um número extraordinário de invertebrados endémicos. Entre estes, destacam-se várias espécies de aranhas, escaravelhos, caracóis e outros grupos que evoluíram em isolamento, adaptando-se às condições particulares destas florestas húmidas.

Um exemplo notável é o escaravelho-da-laurissilva (Tarphius azoricus), uma espécie que se alimenta de fungos e que habita exclusivamente nos troncos em decomposição das florestas nativas açorianas. Este pequeno coleóptero, com menos de 5 milímetros de comprimento, desempenha um papel ecológico importante na decomposição da matéria orgânica e no ciclo de nutrientes destas florestas singulares.

A conservação destes invertebrados endémicos depende diretamente da preservação dos fragmentos remanescentes de floresta laurissilva nos Açores, atualmente limitados principalmente a zonas de altitude e áreas protegidas.

Animais Endémicos do Arquipélago da Madeira

A Madeira, à semelhança dos Açores, constitui um hotspot de biodiversidade com numerosas espécies endémicas, resultado de processos evolutivos em isolamento. A idade geológica mais avançada deste arquipélago, em comparação com os Açores, contribuiu para níveis ainda mais elevados de endemismo.

Pombo-trocaz (Columba trocaz)

O pombo-trocaz, também conhecido como pombo-da-Madeira, é uma ave endémica da ilha da Madeira, onde habita as florestas de laurissilva que persistem principalmente nas encostas norte da ilha.

Esta espécie desempenha um papel ecológico crucial como dispersora de sementes de várias árvores nativas, contribuindo para a regeneração natural da floresta laurissilva. No passado, foi perseguida pelos agricultores, que a consideravam uma praga para as culturas, e sofreu com a destruição do seu habitat natural.

Graças a esforços de conservação iniciados na década de 1980, incluindo a proteção legal da espécie e do seu habitat, bem como campanhas de sensibilização junto da população local, o pombo-trocaz recuperou de um estado crítico de ameaça e as suas populações encontram-se atualmente mais estáveis, embora continue classificado como “vulnerável”.

Lagartixa-da-Madeira (Teira dugesii)

A lagartixa-da-Madeira representa um caso notável de radiação adaptativa, tendo evoluído em diferentes subespécies nas várias ilhas e ilhéus do arquipélago da Madeira. A subespécie da ilha principal (Teira dugesii dugesii) difere ligeiramente das encontradas em Porto Santo, Desertas e Selvagens, demonstrando como o isolamento geográfico pode levar a processos de especiação.

Este pequeno réptil, facilmente observável em toda a ilha da Madeira, adaptou-se a uma grande variedade de habitats, desde a costa rochosa até às montanhas, e está presente tanto em ambientes naturais como em jardins e áreas urbanas. A sua dieta omnívora, que inclui insetos, frutos e até restos de alimentos humanos, contribuiu para a sua adaptabilidade.

Curiosamente, a lagartixa-da-Madeira foi introduzida nos Açores durante o período dos Descobrimentos, provavelmente de forma acidental em navios que faziam a ligação entre os dois arquipélagos, e estabeleceu-se com sucesso em várias ilhas açorianas, onde não existiam outros répteis nativos.

A Importância da Conservação das Espécies Endémicas

As espécies endémicas de Portugal representam um património natural insubstituível, fruto de milhões de anos de evolução em condições ecológicas particulares. A sua conservação é imperativa por múltiplas razões.

Sensibilidade Ecológica das Espécies Endémicas

As espécies endémicas, especialmente aquelas com distribuição geográfica muito restrita, tendem a apresentar uma vulnerabilidade acrescida a alterações no seu habitat. Por terem evoluído em isolamento, muitas vezes desenvolveram adaptações muito específicas que as tornam pouco resilientes face a mudanças ambientais rápidas.

Adicionalmente, muitas destas espécies existem em populações relativamente pequenas, o que as torna mais suscetíveis a problemas como a perda de diversidade genética, doenças ou eventos catastróficos que podem afetar toda a população. No caso dos endemismos insulares, como o morcego-dos-Açores ou o pombo-trocaz, esta vulnerabilidade é particularmente acentuada.

Principais Ameaças

As espécies endémicas portuguesas enfrentam numerosos desafios para a sua sobrevivência, muitos deles resultantes da atividade humana:

  • Destruição e fragmentação de habitats: A conversão de áreas naturais em terrenos agrícolas, zonas urbanas ou infraestruturas turísticas representa uma das maiores ameaças, particularmente grave em ecossistemas como a floresta laurissilva da Madeira ou as zonas ribeirinhas que o saramugo habita.
  • Espécies invasoras: A introdução de espécies exóticas, seja acidental ou deliberada, pode ter efeitos devastadores sobre a fauna endémica, especialmente em ilhas. Predadores como o gato ferral ou competidores como certas espécies de peixes introduzidos representam ameaças sérias para muitos endemismos portugueses.
  • Alterações climáticas: O aquecimento global e as alterações nos padrões de precipitação podem afetar drasticamente os habitats de espécies adaptadas a condições específicas. Anfíbios como o sapo-parteiro-ibérico são particularmente vulneráveis a estas mudanças.
  • Poluição: A contaminação de habitats aquáticos por resíduos agrícolas, industriais ou urbanos afeta diretamente espécies como o saramugo e outros peixes endémicos.

Artigo relacionado: Quais são os animais selvagens em vias de extinção em Portugal?

Esforços de Conservação

Felizmente, diversas iniciativas têm sido implementadas para proteger estas espécies únicas:

  • Criação de áreas protegidas como o Parque Natural da Madeira ou o Parque Natural da Serra da Estrela, que albergam importantes populações de espécies endémicas.
  • Programas de recuperação de habitats, como a reflorestação com espécies nativas em áreas degradadas dos Açores e da Madeira.
  • Projetos de reprodução em cativeiro para espécies criticamente ameaçadas, como o saramugo, seguidos de reintrodução em habitats adequadamente preparados.
  • Monitorização contínua das populações para detetar precocemente problemas e implementar medidas corretivas.
  • Legislação específica para a proteção de espécies ameaçadas e dos seus habitats, incluindo a implementação da Rede Natura 2000 em Portugal.

Papel nos Ecossistemas

Cada espécie endémica desempenha funções ecológicas específicas nos seus habitats. O pombo-trocaz, por exemplo, é um importante dispersor de sementes na floresta laurissilva da Madeira, contribuindo para a regeneração natural deste ecossistema único. Já os invertebrados endémicos dos Açores e da Madeira são essenciais em processos como a decomposição da matéria orgânica e a polinização de plantas nativas.

A perda destas espécies pode, portanto, desencadear efeitos em cascata que afetam todo o ecossistema, perturbando equilíbrios estabelecidos ao longo de milhares ou milhões de anos de coevolução.

Interesse Científico e Educativo

As espécies endémicas constituem excelentes modelos para o estudo de processos evolutivos, adaptações a condições específicas e relações ecológicas. Os arquipélagos dos Açores e da Madeira, em particular, são frequentemente descritos como “laboratórios naturais de evolução”, oferecendo oportunidades únicas para investigadores de áreas como a biologia evolutiva, a biogeografia e a ecologia.

Estas espécies representam também valiosos recursos para a educação ambiental, permitindo ilustrar conceitos como adaptação, especiação, endemismo e conservação de forma tangível e localmente relevante. Conhecer e valorizar o património natural único de Portugal contribui para formar cidadãos mais conscientes da importância da biodiversidade.

Potencial para o Turismo de Natureza

O turismo de natureza, em particular a observação de fauna selvagem, representa um setor em crescimento que pode beneficiar da presença de espécies endémicas. Atividades como a observação de aves na Madeira, onde o pombo-trocaz é uma atração para birdwatchers, ou percursos interpretativos focados na fauna única dos Açores, podem gerar benefícios económicos para as comunidades locais enquanto promovem a conservação.

Este tipo de turismo, quando devidamente regulamentado e gerido de forma sustentável, pode converter a biodiversidade endémica num ativo económico que justifica a sua preservação aos olhos das comunidades locais e dos decisores políticos.

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Portugal, na sua modesta extensão territorial, alberga um património natural extraordinariamente rico em termos de endemismos faunísticos. Das montanhas do continente às florestas primitivas dos Açores e da Madeira, estas espécies únicas refletem a diversidade de condições ecológicas do nosso país e a complexidade dos processos evolutivos que aqui ocorreram.

Conhecer, valorizar e proteger estes animais que não existem em nenhum outro lugar do mundo não é apenas uma responsabilidade de conservação — é um ato de preservação da identidade natural de Portugal. Estas espécies exclusivas do nosso território são testemunhas vivas da história natural única do país e constituem um legado que devemos transmitir às gerações futuras.

A conservação efetiva deste património biológico requer uma combinação de investigação científica, medidas de proteção de habitats, envolvimento das comunidades locais e sensibilização do público. Só através de uma abordagem integrada será possível garantir que estas espécies, que levaram milhares ou milhões de anos a evoluir, não desapareçam em apenas algumas décadas devido à ação humana.

Cada cidadão pode contribuir para este esforço coletivo, seja através de escolhas de consumo mais sustentáveis, participação em iniciativas de ciência cidadã para monitorização de espécies, ou simplesmente desenvolvendo e partilhando o conhecimento sobre a extraordinária biodiversidade endémica de Portugal. Afinal, só podemos proteger aquilo que conhecemos e valorizamos.

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