Sais todo o dia, fechas a porta, e logo após reconheces aquele som familiar: ladrares desesperados, miados insistentes, ou pior ainda: a descoberta de destruição quando regressas a casa. A ansiedade de separação é uma realidade para muitos tutores, e não, não é birra do animal. É um problema comportamental genuíno que causa verdadeiro sofrimento ao teu companheiro de quatro patas. Mas a boa notícia? Existem estratégias concretas que funcionam.

Sinais que Revelam a Ansiedade

A ansiedade de separação manifesta-se de formas variadas, e nem sempre é o ladrar ou  miar óbvio que alerta os tutores. Alguns animais são mais discretos ou dramaticamente ruidosos.

A vocalização excessiva é talvez o sinal mais evidente. Ladrares, uivos ou miados que começam logo após a tua partida e continuam por períodos prolongados são claramente uma tentativa de comunicar desconforto. Mas há mais: muitos vizinhos acabam por ser as primeiras "testemunhas" deste problema antes do próprio tutor se aperceber.

Os comportamentos destrutivos são outro indicador claro. O teu cão começou a arranhar compulsivamente a porta? O teu gato, que nunca tinha roído nada, está agora a masticar móveis? Aqui está o pormenor importante: observa quais os objetos que estão a ser destruídos. Frequentemente, os animais concentram-se em itens que têm o cheiro mais forte do tutor, como roupas usadas recentemente, sapatos, sofás onde habitualmente te sentas. Isto revela que o comportamento não é simples tédio, mas uma tentativa de auto-conforto através da tua presença olfativa.

A eliminação inadequada é particularmente relevante nos gatos. Um gato que sempre usou a caixa de areia corretamente de repente começa a urinar fora do local? Antes de presumir qualquer coisa, verifica primeiro com um veterinário se há causas físicas. Mas se a saúde está bem e os "acidentes" ocorrem principalmente quando estás ausente, é provável ansiedade de separação. Nos cães, o padrão é semelhante: urinarem ou defecarem dentro de casa mesmo quando treinados.

Existem ainda sinais menos óbvios: apatia extrema, perda de apetite, tentativas de fuga arriscadas (que podem resultar em auto-lesão), comportamentos compulsivos como andar em círculos ou lamber excessivamente as patas. Alguns animais ficam silenciosos demais, uma depressão comportamental que é tão preocupante quanto o pânico barulhento.

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Causas mais Comuns

A ansiedade de separação não surge do nada. Geralmente, há um ou vários fatores desencadeantes envolvidos.

As mudanças abruptas na rotina são um dos maiores culpados. Tens um cão que passou umas férias inteiras contigo, e agora regressas ao trabalho? Isso pode ser um choque. Repentinamente, o animal passa de estar contigo o dia inteiro para estar sozinho 8 horas. Isso é suficiente para desencadear ansiedade grave, especialmente se o animal nunca foi ensinado a estar sozinho.

A falta de socialização e estímulo mental também contribui. Um animal que passou a vida colado ao tutor, sem experiência em ficar sozinho, nunca desenvolveu as ferramentas psicológicas para lidar com a separação. Não aprendeu que a solidão é temporária, que regressas sempre, que tudo fica bem.

Experiências traumáticas anteriores como abandono, adoções múltiplas ou abuso deixam cicatrizes profundas. Um animal que viveu estes traumas pode ter uma hipervinculação patológica, onde a figura do tutor se torna uma âncora emocional absoluta.

Mas talvez o fator mais subestimado seja a hipervinculação criada sem querer pelos próprios tutores. Aquele cão que te segue de divisão em divisão, que fica ansioso quando vais à casa de banho, que te oferece comportamentos de extrema excitação quando regressas é um animal hipervinculado. Isto não é manha, é uma dependência emocional que impede o animal de desenvolver confiança na sua capacidade de estar sozinho.

Estratégias para Reduzir a Ansiedade de Separação

O bom da história é que a ansiedade de separação pode ser reduzida significativamente com estratégias bem executadas. Mas exige consistência, paciência, e a atitude correta do tutor.

Treino de Saídas Progressivas

A dessensibilização gradual começa com ausências muito curtas, literalmente alguns minutos. Sai de casa e volta antes do animal ficar realmente ansioso. A chave é voltar enquanto ainda está relativamente calmo, recompensando essa calma com petiscos ou elogios suaves (não com o "grande momento" de festa que muitos fazem).

Repete este processo múltiplas vezes ao dia se possível. Gradualmente, aumentas o tempo de ausência, mas o aumento deve ser lento. Dias ou semanas podem ser necessários para progredir de 5 minutos para 30 minutos. Sim, é moroso, mas funciona.

Um pormenor crítico: quando regressas, não faças um grande alarido. Entra calmamente, ignora inicialmente o animal, e apenas depois de tudo estar calmo, ofereces atenção. Isto evita que o animal associe a tua volta à recompensa máxima, o que paradoxalmente aumenta a ansiedade de espera.

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Criar um Ambiente Seguro

Cria um espaço específico como, por exemplo, uma divisão que o animal associa a segurança e conforto. Este não deve ser um local de castigo (nunca feches o animal ali como punição, pois isso destrói completamente o objetivo). Deixa lá os seus brinquedos preferidos, uma cama confortável e objetos familiares com o teu cheiro.

Para gatos, um arranhador no espaço é essencial porque ajuda-os a marcar território e a sentirem-se no controlo. Ambos podem beneficiar de uma fonte de água e um local para eliminar (caixa de areia para gatos, ou área designada para cães).

Estímulos Positivos Durante a Ausência

Muita ansiedade está também associada a tédio. Deixa brinquedos interativos, por exemplo,  aqueles que libertam comida à medida que o animal brinca porque mantêm-no ocupado durante períodos significativos. Puzzles alimentares, brinquedos que se movem ou fazem barulho, ossos para roer (no caso dos cães).

O ideal é rodar os brinquedos. Não deixas os mesmos todos os dias, pois isso reduz o interesse. Mantém uma selecção de 3 ou 4, e alterna-os diariamente. Isto cria um elemento de surpresa que mantém o estímulo mental elevado.

Para gatos, considera interruptores automáticos de brinquedos, ou deixa a televisão ou rádio a tocar com o volume baixo. Alguns animais encontram conforto em sons ambientes.

Evitar Despedidas Dramáticas

Sim, é tentador dar aquele abraço de despedida longo e carinhoso, mas isto apenas amplifica a ansiedade. Mantém as saídas e regressos discretos e neutros. Trata a tua saída como algo completamente normal e sem importância. Trata o teu regresso da mesma forma: entra, espera que o animal se acalme, depois ofereces atenção.

Reforçar a Independência

Aqui está uma estratégia frequentemente negligenciada: durante o tempo que passas em casa, treina o cão ou gato a ocupar-se sozinho. Deixa-o numa divisão diferente por períodos, incentiva-o a brincar sozinho, pratica deixá-lo a uma distância de ti enquanto trabalhas. Isto constrói a confiança do animal em estar confortável sem contacto constante.

Quando Estratégias Comportamentais Precisam de Apoio Profissional

Às vezes, as técnicas comportamentais sozinhas não são suficientes. É aqui que entram os suplementos e produtos especializados.

As feromonas sintéticas replicam compostos químicos calmantes que os animais produzem naturalmente. Isto não é magia, é biologia: estas feromonas enviam mensagens de segurança ao sistema nervoso do animal. Usar um difusor ou spray nestas situações pode reduzir significativamente os níveis de stress.

Existem também suplementos nutricionais que ajudam. Estudos mostram que certos reduzem comportamentos ansiosos. Mas — importante — fala sempre com o veterinário antes de introduzir qualquer suplementação.

Em casos mais graves, o veterinário pode prescrever medicação temporária que funciona especificamente para ansiedade e fornece o suporte químico necessário enquanto as técnicas comportamentais fazem efeito. A medicação é frequentemente mais eficaz quando combinada com modificação comportamental.

Isto Leva Tempo, mas Traz Resultados

Tratamento de ansiedade de separação pode ser moroso, pode levar semanas ou meses e haverá contratempos. Haverá dias em que parece que estás a regredir, não a progredir, mas vale a pena.

Um animal livre de ansiedade de separação é um animal que vive melhor. Tu também vives melhor, sem culpa, sem ansiedade sobre o que vais encontrar em casa.

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A chave é paciência genuína, consistência rigorosa e empatia profunda pelo que o teu animal está a sentir. Não é birra, não é mau comportamento, é sofrimento. E com as estratégias corretas, esse sofrimento pode diminuir significativamente.