Tosquia em Gatos: O Que Muda em Relação ao Grooming Canino?
Vês cada vez mais tutores a procurar serviços de grooming para os seus felinos, e isso não é coincidência. Embora seja mais comum associarmos a tosquia aos cães, os nossos amigos felinos também requerem cuidados específicos que vão muito além da escovagem básica.
A crescente procura por serviços de grooming felino reflete a evolução na relação entre tutores e gatos. Mais de metade dos lares portugueses acolhem animais de estimação, e este número tem vindo a aumentar nos últimos 10 anos. Os gatos deixaram de ser vistos apenas como animais independentes que cuidam de si mesmos, tornando-se verdadeiros membros da família que merecem cuidados especializados.
No entanto, aqui está o ponto crucial: a abordagem no grooming felino é completamente distinta da canina e exige conhecimentos técnicos e comportamentais próprios. Não se trata simplesmente de usar as mesmas técnicas que funcionam com cães, os felinos têm necessidades únicas que, quando ignoradas, podem transformar uma sessão de grooming numa experiência traumática para todos os envolvidos.
As Principais Diferenças Entre Tosquiar Gatos e Cães
Comportamento: Uma Questão de Temperamento
A diferença mais marcante entre trabalhar com gatos e cães reside no comportamento. Os gatos são animais que prezam o seu território, que lhes é familiar e é onde se sentem seguros. São também animais rotineiros e que necessitam de previsibilidade, familiaridade e controlo.
Os gatos são animais sensíveis e a tosquia pode ser uma experiência stressante para eles, especialmente se não estiverem acostumados. O ruído da máquina de tosquia, o maneio e a contenção podem causar ansiedade e medo no animal. Ao contrário dos cães, que frequentemente se adaptam bem à manipulação e até podem encarar a ida ao groomer como uma atividade social, os gatos tendem a ser muito mais reservados e defensivos.
A resposta mais usual por parte de um gato quando está perante uma situação que lhe causa ansiedade ou medo é evitá-la, fugindo ou escondendo-se. Quando não lhes é permitido ter este comportamento natural, aumenta o grau de frustração e espoleta a resposta comportamental negativa.
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Anatomia: Estruturas Delicadas que Requerem Cuidados Especiais
Do ponto de vista anatómico, existe uma diferença substancial que não pode ser ignorada. A pele dos gatos é fina e delicada, tornando-os propensos a cortes e irritações durante a tosquia. O risco de lesões é ainda maior se o gato se mover ou resistir ao procedimento.
Os cães, especialmente as raças maiores, têm geralmente uma pele mais espessa e resistente. Os gatos, independentemente do tamanho, mantêm uma estrutura corporal mais delicada, com zonas particularmente sensíveis como a barriga, a região das axilas e as patas traseiras. Além disso, a pelagem felina tem características únicas, mesmo em gatos de pelo curto, existe uma textura e densidade que requer abordagens específicas.
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Equipamento: A Importância do Silêncio
Nos gatos, os sentidos de audição, olfato e visão são extremamente apurados. Isto significa que o equipamento utilizado precisa de ser adaptado às suas sensibilidades. Máquinas ultra silenciosas com menos de 50dB são essenciais para reduzir o stress do animal durante a tosquia.
Enquanto um cão pode tolerar o ruído de uma máquina convencional, para um gato esse mesmo ruído pode ser absolutamente aterrorizante. É necessário investir em equipamento específico: máquinas sem fios com lâminas de cerâmica amovível, suficientemente potentes para cortar os pelos suavemente e de maneira muito eficaz, mas mantendo um funcionamento silencioso.
Técnica: Movimentos Suaves e Paciência Infinita
A técnica de tosquia para gatos requer uma abordagem completamente diferente. Os movimentos devem ser mais suaves, mais lentos e com pausas frequentes para permitir que o animal se acalme. É aconselhável que a tosquia do gato, higiénica ou estética, seja feita por profissionais qualificados, que conheçam as características e especificidades de cada raça.
Enquanto com cães é possível manter um ritmo constante de trabalho, com gatos é fundamental respeitar o tempo do animal. Muitas vezes é necessário dividir a sessão em várias partes, permitindo períodos de descanso entre elas.
Os Principais Motivos para a Tosquia em Gatos
Pelos Longos ou Embaraçados
Gatos de pelo longo: Raças como Persa, Maine Coon e Himalaio podem beneficiar da tosquia para evitar nós, emaranhados e a acumulação de pelos mortos, especialmente em climas quentes. Estas raças, com a sua pelagem exuberante, podem desenvolver nós dolorosos quando não recebem manutenção adequada.
Entre as raças que precisam de cuidados frequentes com o pelo, salientamos: Os Persas, gatos singulares de focinho achatado e corpo atarracado precisam de apoio na sua higiene. Devido à sua fisionomia têm mais dificuldades em limpar os olhos e nariz. Os Bosques da Noruega, Maine Coon, Birmanês e o Ragdoll também se encontram nesta categoria especial.
Formação de Nós e Mantas de Pelo
A formação de nós não é apenas uma questão estética, pode tornar-se um problema de saúde sério. A tosquia do gato na zona da barriga impede a formação de nós, situações comuns nesta zona devido à textura muito fina dos pelos. Os nós puxam a pele, causam desconforto e podem até levar a infeções cutâneas.
Questões Médicas ou de Higiene
No caso dos gatos com problemas de pele, a tosquia pode facilitar o tratamento de dermatites, alergias e outras condições de pele, permitindo a aplicação de medicamentos tópicos e a melhor ventilação da área afetada. Gatos idosos ou obesos têm dificuldade de se lamberem e limparem, o que pode levar à acumulação de sujidade e nós, tornando a tosquia uma medida higiénica importante.
A tosquia do gato nas regiões íntimas, proporciona uma melhor limpeza do animal após o uso da sua caixa de areia, contribuindo para evitar a propagação de bactérias, bem como maus odores. Esta tosquia higiénica torna-se especialmente importante em gatos com mobilidade reduzida.
Redução da Queda de Pelo e Prevenção de Bolas de Pelo
Os gatos com excesso de pelos, em alguns casos, a tosquia pode ajudar a reduzir a quantidade de pelos ingeridos durante a limpeza, diminuindo o risco de bolas de pelo nos gatos e problemas gastrointestinais. Para gatos que sofrem regularmente com bolas de pelo, uma tosquia estratégica pode fazer uma diferença significativa na sua qualidade de vida.
Quando a Tosquia Felina Não É Recomendada
Gatos com Historial de Stress Elevado
O stress que o felino pode sentir no momento da tosquia, não só por estar contido, mas também devido ao barulho da máquina, pode ser contraproducente. Gatos com historial de agressividade ou que demonstrem sinais extremos de ansiedade podem não ser candidatos ideais para tosquia.
Os gatos stressados podem apresentar comportamentos anormais ou imprevisíveis, agressividade, vocalizações excessivas, apatia, aumento do isolamento social e alterações nos hábitos de higiene. Nestes casos, é crucial avaliar se os benefícios superam os riscos.
Quando a Escovagem Resolve o Problema
A escovagem frequente é a melhor maneira de remover pelos mortos, evitar nós e manter a pelagem do gato saudável. Se uma boa rotina de escovagem consegue manter o pelo em condições adequadas, a tosquia pode ser desnecessária.
Na esmagadora maioria dos casos, o gato não necessita de ser tosquiado. A natureza já equipou os felinos com excelentes capacidades de auto-limpeza, e muitas vezes uma manutenção preventiva é suficiente.
Ausência de Necessidade Real
A pelagem dos gatos desempenha um papel crucial na regulação da temperatura corporal, protegendo-os do calor, do frio e dos raios solares. A tosquia remove essa proteção natural, tornando o gato mais vulnerável a queimaduras solares, hipotermia e outros problemas relacionados à temperatura.
Tosquias puramente estéticas, sem justificação médica ou de bem-estar, devem ser cuidadosamente ponderadas. O pelo do gato serve múltiplas funções além da aparência, incluindo proteção e regulação térmica.
Dicas Para Preparar e Realizar a Tosquia com Segurança
Avaliação Prévia com o Tutor
Antes de qualquer procedimento, é fundamental uma conversa detalhada com o tutor. É necessário conhecer o temperamento do gato, experiências anteriores com maneio, problemas de saúde existentes, e estabelecer expectativas realistas sobre o resultado e o processo.
Se o seu patudo tem um temperamento difícil, avise o tosquiador para a dificuldade acrescida. Se achar necessário, peça ao veterinário um medicamento para deixar o animal mais calmo. Esta informação prévia pode fazer a diferença entre uma sessão bem-sucedida e uma experiência traumática.
Manter o Ambiente Calmo
O espaço da tosquia deve ser um local seguro, capaz de proporcionar ao seu gato um ambiente calmo e tranquilo, evitando assim situações de stress. Isto significa eliminar ruídos desnecessários, outros animais por perto, e manter uma temperatura confortável.
O ambiente deve ser previamente preparado com todos os materiais necessários ao alcance, evitando movimentos bruscos ou ruídos inesperados durante o procedimento.
Contenção Suave com Toalhas
Sempre que seja necessário realizar uma contenção física para alguns procedimentos, prima-se pela calma e tranquilidade. Por norma, e sempre que o paciente o permita desta forma, fazemos recurso apenas a mantas ou toalhas, deixando-o contido, mas confortável.
A técnica do “embrulho em toalha” ou “purrito” é particularmente eficaz com gatos, proporcionando segurança sem trauma. É importante evitar contenção forçada sempre que possível, pois isto apenas aumentará o stress do animal.
Trabalhar com Outro Profissional
É melhor serem duas pessoas a tosquiar um gato, especialmente nas primeiras vezes. Uma pessoa dedica-se exclusivamente ao manuseamento e tranquilização do animal, enquanto a outra realiza o procedimento de tosquia.
Esta abordagem em equipa é especialmente importante com gatos mais nervosos ou em tosquias mais extensas. A pessoa responsável pela contenção pode oferecer snacks, carícias e palavras tranquilizadoras.
Conhecer Sinais de Stress e Saber Quando Parar
Entre os sinais de stress em gatos incluem-se: comportamento agressivo incomum, marcação excessiva do território, perda de apetite, comportamento anormal, fazer as necessidades fora da caixa de areia. Durante a tosquia, é crucial estar atento a sinais como respiração acelerada, salivação excessiva, tentativas desesperadas de fuga, ou vocalização intensa.
O profissional qualificado deve sempre priorizar o bem-estar do animal sobre a conclusão do procedimento. Por vezes é necessário parar, permitir um período de recuperação, ou até mesmo reagendar para outro dia.
Orientações Para Comunicar com os Tutores
Explicar Riscos e Cuidados
É fundamental que a decisão de sedar um gato ou cão para a tosquia seja avaliada, prescrita e acompanhada por um médico veterinário. Embora nem todas as tosquias requeiram sedação, é importante que os tutores compreendam que esta pode ser uma opção em casos extremos.
Os tutores devem ser informados sobre possíveis riscos, incluindo cortes durante o procedimento, especialmente em animais em pior estado que são mais suscetíveis a cortes, bem como sobre a possibilidade de reações comportamentais pós-tosquia.
Aconselhar Sobre Manutenção em Casa
A escovagem regular é importante para remover os pelos mortos e melhorar a respiração da pele. Ajuda, ainda, a diminuir a formação de bolas de pelo que vão parar ao estômago, causando vómitos, prisão de ventre e perda de apetite.
É essencial educar os tutores sobre a importância da manutenção regular entre sessões profissionais. Isto inclui técnicas de escovagem adequadas, produtos recomendados, e sinais de alerta que justifiquem uma visita antecipada.
Tranquilizar Quanto ao Bem-estar
Alguns gatos lambem excessivamente a pele após a remoção dos nós, o que pode causar vermelhidão e irritação. Este comportamento deve diminuir em poucos dias. É normal que os tutores se preocupem com mudanças no comportamento do animal após a tosquia.
É importante explicar que algum desconforto inicial é normal, mas que deve ser monitorizado. Para os gatos a sua pelagem é parte da sua identidade, ao tosquiar o seu gato pode provocar um desequilíbrio emocional no animal, mas este ajuste é temporário na maioria dos casos.
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A Formação e Sensibilidade São Fundamentais
A tosquia em gatos exige muito mais do que competência técnica, requer formação específica, sensibilidade aguçada e respeito profundo pelo comportamento natural da espécie. O curso de tosquia e grooming da Nubika prepara os formandos para desempenharem funções ao nível da prestação de cuidados de higiene e estética canina e felina, incluindo conhecer as bases do comportamento canino e felino.
Um groomer verdadeiramente preparado para trabalhar com felinos compreende que cada gato é um indivíduo único, com as suas próprias necessidades, medos e limitações. Quanto mais positiva for a experiência em consulta, reduzindo o medo e ansiedade, melhores resultados podem ser esperados em visitas futuras. Isto aplica-se igualmente ao grooming: uma primeira experiência positiva pode definir a relação futura entre o gato e os cuidados de estética.
Os gatos merecem profissionais que compreendam as suas particularidades e que estejam equipados, tanto em termos de conhecimento como de equipamento, para lhes proporcionar cuidados seguros e respeitosos.
Quando um groomer consegue dominar a arte de trabalhar com felinos, oferece um serviço verdadeiramente diferenciado. É capaz de transformar o que poderia ser uma experiência traumática numa rotina de cuidados tranquila e benéfica, respeitando sempre os limites naturais do animal.
A tosquia felina representa, portanto, uma área que combina conhecimento técnico, sensibilidade comportamental e equipamento adequado. Para os profissionais que abraçam este desafio, as recompensas incluem não apenas a satisfação de proporcionar bem-estar aos animais, mas também o reconhecimento de uma competência especializada que é cada vez mais valorizada pelos tutores conscientes.